Ele fechou a porta e apagou o cigarro. A luz era baixa, com
pequenos curtos na instalação elétrica; a pia da cozinha gotejava sem pedir
licença, molhando a louça há semanas acumulada; a sala que também era seu
quarto continha apenas algumas almofadas encardidas com fugas no forro de fibra...
e ela.
Ela então se sentou beirando o sofá e lhe lançou um olhar
tão efusivo e fuzilador que seus membros estremeceram; ele levantou sem pressa
ou presságio seus olhos em direção aos dela, sem fugir, sem negar... Ela
acendeu um cigarro e pediu um drink, “senta aqui, senti sua falta”.
As palavras eram tão dispensáveis quanto a energia elétrica
naquele instante; eles se entendiam, se sentiam, sentiam muito, falavam pouco...
O silêncio não era constrangedor de qualquer forma, mas sim aconchegante; ele a
abraçou e a sentiu mais uma vez em seus braços, dois corações em batida
ritmada, apressados demais para qualquer tipo de cordialidade. Ele serviu um
copo contendo suas digitais, de um vinho vagabundo já aberto... “também senti
saudades”.
O vinho foi rápido, tão logo como ela que também se foi;
trazendo a luz do dia e a monotonia de mais um domingo amargo, úmido de
nostalgia, suado de prazer noturno. Ao lado dele a companhia que ela também
levara na bolsa, no peito, no amargor da boca cansada, da língua doce, dos
cabelos bagunçados...
Junto deles a mesma
companhia de sempre...
"Saudades".
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