segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Saudade


Ele fechou a porta e apagou o cigarro. A luz era baixa, com pequenos curtos na instalação elétrica; a pia da cozinha gotejava sem pedir licença, molhando a louça há semanas acumulada; a sala que também era seu quarto continha apenas algumas almofadas encardidas com fugas no forro de fibra... e ela.

Ela então se sentou beirando o sofá e lhe lançou um olhar tão efusivo e fuzilador que seus membros estremeceram; ele levantou sem pressa ou presságio seus olhos em direção aos dela, sem fugir, sem negar... Ela acendeu um cigarro e pediu um drink, “senta aqui, senti sua falta”.

As palavras eram tão dispensáveis quanto a energia elétrica naquele instante; eles se entendiam, se sentiam, sentiam muito, falavam pouco... O silêncio não era constrangedor de qualquer forma, mas sim aconchegante; ele a abraçou e a sentiu mais uma vez em seus braços, dois corações em batida ritmada, apressados demais para qualquer tipo de cordialidade. Ele serviu um copo contendo suas digitais, de um vinho vagabundo já aberto... “também senti saudades”.

O vinho foi rápido, tão logo como ela que também se foi; trazendo a luz do dia e a monotonia de mais um domingo amargo, úmido de nostalgia, suado de prazer noturno. Ao lado dele a companhia que ela também levara na bolsa, no peito, no amargor da boca cansada, da língua doce, dos cabelos bagunçados...

Junto deles a mesma companhia de sempre...

"Saudades".

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