quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Maré Viva

A margem do rio me mata
Sinto-me vivo na maré alta
Clamo pela forte correnteza
Eu quero mesmo é não dar pé
Deixa a onda bater!

E se acontecer de eu me afogar
Que me deixem beira mar
Pra água vir me inundar
E assim que eu possa morrer
Tendo visto o caos de todo ser
Tendo sido eu, maré viva
Sem qualquer renúncia
Sem qualquer esquiva
Das tormentas da vida
Sentir o sangue escorrer
O mar me ensinou,
Deixa a água correr.

Notívaga

Não sabia se era dia
Mas de dia ela dormia
E de noite ela sentia
A dor da vida vazia
E bebia
E falava
E sorria

Não sabia se era dia
Sequer sabia o que queria
Então de dia ela dormia
E de noite ela fingia
Que sempre era sexta
Que tudo era festa
E sentava
E corria
E caía

Não sabia se era dia
E se era, nada dizia
Porque de dia
Ela dormia
Ela sonhava
Ela fugia

Não entendia que,
À noite
A noite
Há noite

..Era mentira.

Poesia de Banheiro

Então te sentas em teu trono de cerâmica
De um profundo branco marfim
E rejeitas por tudo e por fim
Tudo que antes quiseste...
Com ânsia, com fome, com desejo.

Num esforço rotineiro
Despejas com repulsa tua podridão
Que desaguará num soar sonoro
De uma despedida sem cortejo.

Aliviado relaxas teu corpo e,
Ao findar dessa romaria,
Enfrentas o resto do dia
Mais leve.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Entardecer


A neblina desce sobre as montanhas
Seres vagueiam em meio às multidões
Uma nulidade de corpos oblíquos
Difusos de suas carrancas e medos

O sol esconde-se dissimuladamente
Por entre as coxas estéreis da lua
Adentrando o ventre da noite
Cachorros perdem seus rumos
Os gatos acordam num susto

Suspiros ecoam lajeando o cansaço
Amantes não mais amarão
As horas estagnarão num nó
Despedem-se os colegas do labor
Cinismos dão vazão ao maxilar leve

Não há mais sorrisos vãos ou telefonemas
Os sinos tocam arrependidos do pesar
Pássaros hão de, penosos, voltar
Silenciando o torpor das esquinas
Impregnados do zumbir diário, os sensíveis
Recolherão suas carcaças do flagelo
Preferindo a procrastinação ao descompasso

Cortinas de horas pairam sobre ombros
Indecifráveis obrigatoriedades
Lágrimas se recolhem e nada se pode sentir

Postergarás as horas póstumas, cimentando
O dó da canção do exílio e da dor
Eximindo os vermes de qualquer carniça-fria
Fervendo o sangue e pulando os cordões
Chegando a tempo paras as últimas lotações

Findou-se mais uma tarde e eu, covarde, fugi.

Fumar



Prós:
-Alivia a ansiedade
-Faz companhia
-Alimenta a poesia
-Ajuda com o estresse
-Acompanha bem teus surtos
-Evita um pouco o álcool
-Depois do almoço
-Nas festas se fazem necessários
-Combina com a tristeza e com o café
-Faz companhia
-Resolve o lance da fé
-Refugio do suicida covarde
-Zona de conforto, esfumaçada
-Descreve bem o sentimento de querer que o mundo exploda
-Embalagens interessantes
-Difícil largar o vício
-O silêncio e o momento do fumo
-O ato de segurar o cigarro
-Comer menos
-O efeito químico da nicotina
-Fumaça



Contras:
-Não entorpece
-Indústria milionária e suja
-Estratégia publicitária apelativa
-Campanhas de saúde mais apelativas ainda
-Mata gradativamente
-Tens problemas respiratórios
-Não tens fôlego pra mais nada
-Tosses tipo cão dia-e-noite
-Tens dores de estômago
-Tens dores de cabeça
-Teu coração não aguenta
-Teu pulmão às vezes dói
-Tua família se preocupa...
-É frio lá fora, onde te retiras pra fumar...
-Tens pneumonia ciclicamente, há de tornar isso mais frequente.
-Tu sempre odiaste isso, lembra?!
-Não resolve teus problemas.
-Gasta dinheiro que não tens sobrando.
-Fedes a cigarro. Mãos, cabelos, roupas.
-Olha pra tua avó...




- Cansei de pesar... Vou fumar um cigarro.