quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Olhos no Instante

Entre escombros e lutos mal dormidos eu encontrei minhas ruínas e todas as mentiras que contei frente ao espelho como formas de afirmação e raízes.

Fiz frente à minha solidão sem dar-me conta do afastamento providencial dos que tentaram entrar de forma falha e miserável na caverna dos segredos que jamais viram os raios dos dias nascerem.

Os prazeres furtivos, as emoções rasas mascaradas de entrega e cumplicidade, os olhares desviados e os choros cansados e calados que falavam, mas que nunca disseram nada.

Metamorfoseei meus dramas em dramas de outrem e logo tudo me doía exceto o que era meu porque o que era meu destruiria em velocidade exponencial o mundo que construí arduamente de barro, tapumes e galhos.

Mas a enxurrada levou meu barraco, encharcou a mobília, deixou os lençóis já puídos imundos de lama e caos. Os gatos não entenderam nada, o cachorro encontrou um osso em meio aos destroços e de meus olhos sequer uma lágrima caiu.

Eu que há tempos caí na mentira de Carlos e que hoje sei que os ombros suportam sim o mundo, mas que o peso jamais se equiparou às mãos de uma criança.

Fiz do meu corpo cansado martírio de corpos alheios e sofri por cada pedra no caminho pelo qual sequer passei ou haveria de passar. Logo criei hérnias nos ombros, torcicolos, escolioses pela coluna vertebral e bursite nos quadris.
E tem ainda essa maldita enfermidade das vias aéreas que volta e meia me surra, esfregando minha cara no asfalto dos lamentos e gritando minhas síndromes e pretensões estúpidas demais tão alto que meus tímpanos não aguentam. Meus ouvidos.. nesses dias meus ouvidos expurgam uns sem fins de frustrações e desesperos.

Mas eu entendi sim o que Carlos quis dizer quando no escuro do quarto fitei teus olhos a resplandecerem, enormes e caleidoscópios, presentes e universais... Olhos instantes. 
Entendi que seríamos nós os delicados a preferirem morrer, mas que apesar e porém, também haveríamos nós de estarmos e resistirmos por termos insignificantemente entendido que sim, a vida é uma ordem...

A vida apenas, sem mistificação.

(João Augusto)

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