quarta-feira, 9 de julho de 2014

Anoitecer


Perdi a noite.
Logo eu, inimiga das manhãs.
Refém das tardes.
Perdi a noite...

Eu, cheia de ânsia de ti.
Deixei morrer as horas póstumas.
Deixei a manhã me cansar e a aurora me caçar...
Cedi.

Caí morta nos braços da noite.
Noite, minha melhor amante, minha meretriz,
Chorou meu fálico cerne imóvel.

Quisera não ter cedido, mas já tarde lamentei.
Nada mais me cabia, a não ser a morada na inércia,
No ócio imprestável, no inútil e no inutilizado.

És inquieta, por isso sonhas.
És insaciável, por isso sofres.
És a emoção do que te possibilitas ser.
És a antítese de uma convenção banal:
O tempo.

-Vejo no escuro das noites, conforto e paixão.
E no claro dia, tristeza e melancolia.

Vejo a fadiga e a carrasca rotina, castigar tudo que o relógio toca.
Vou pro meu esconderijo, na minha noite enluarada.
Não haverão de me achar por nada!
Nem relógio, nem despertador, nem rotina.
Vou pra debaixo da penumbra beber um pouco de vida.

Me embriago,
Cambaleio.
Me embalo,
Saio de mim...
Mas o dia não.

O claro-dia me pega pelas mãos e grita baforando o pior dos hálitos matinais:
-Acorda!

O dia é uma ordem.
A noite é uma escolha.
O dia acolhe a preguiça.
A noite aos prazeres atiça.
A noite é psicodélica.
O dia é careta.

A noite é maçã proibida, que não relutei em provar.
Desse dulçor sou dependente e deste mal inconsequente,
Hei de morrer ou matar.
Não importa.

Anoiteceu e eu... 

Cedi.

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